sábado, 4 de dezembro de 2010

No 30º aniversário da morte de Sá Carneiro

 

U1987698Foto: daqui

O jantar daquela quarta feira até que não foi mau. O Tó Alentejano tinha-me convidado para jantar na residência universitária perto da Avenida de Roma, na companhia do pessoal macaense que era companhia habitual das nossas tertúlias. A nossa conversa versava um encontro casual meu com José Cid na paragem do 45, há algumas horas atrás. E a conversa continuou e fluiu entre jovens que, com 20 anos, pensam ser os detentores da verdade. Ele era política, ele era futebol (mas aqui havia mais convergência, pois éramos todos benfiquistas), ele era religião…

A conversa estava então nas lições curtas e sucintas de mais umas tantas palavras de chinês que os nossos amigos macaenses se divertiam a ensinar-nos. «Como se diz filho da…?», «Como é que se manda um chinês àquela parte», enfim, frases e palavras desgarradas que, num dia mais tarde, nos seria de extrema importância…

A hora do noticiário chegava e um de nós ligou a TV. Mas… estranho. Música clássica? Emissão interrompida?… “Ok, deixa ligado que a gente vai mirando.”

E começaram a chegar as primeiras informações que davam notícia de que, naquele 4 de Dezembro do ano da graça de 1980 tinha ocorrido um despenhamento duma aeronave em Camarate, a poucos quilómetros de onde nos encontrávamos. E que, no meio dos destroços, estavam os corpos de Francisco Sá Carneiro, Adelino Amaro da Costa, respectivas esposas, um assessor, os dois pilotos e um popular apanhado no meio da rua!

francisco_sa_carneiro  amaro

As horas seguintes foram passadas a seguir a informação constante, “pode ser que não tenha sido bem assim”, “pode ter havido trocas de identidades”… Mas não, efectivamente, a história batia toda certa. Era mesmo Sá Carneiro e restante comitiva que jaziam mortos, algures no meio de ferros e chapas retorcidas.

Imagem acidente CAMARATE

 

Naquela época, era de Esquerda. Quem é que, nos seus 20 anos não é de Esquerda? As minhas referências eram Soares, Salgado Zenha e outros políticos que, seis anos antes nos tinham tirado da ditadura.

Quanto a Sá Carneiro, para mim era uma pessoa bastante educada, com o dom da palavra, senhor de uma boa argumentação. Mas não sei porquê, aquela morte (como qualquer morte) fez-me estremecer por dentro. Senti um mal estar imenso e quando saí para apanhar o Metro para os Anjos, notei um ar muito estranho naquela quarta feira. Era Dezembro mas o tempo estava seco. Havia como que um ar pesado, tivesse lá ele o peso que tivesse. Mas estava estranho, as pessoas calmas, mas estranhas, como algo premonitório dos maus tempos que lhe seguiriam.

No fim de semana seguinte, assisti ao funeral daquele Homem pela tv, reparei que eu, embora não estando “lá”, estava realmente naquele funeral. Era um bocado de nós que ali ia: era seriedade, era frontalidade, era exemplo, eram valores. Principalmente, Valores, algo que hoje, infelizmente, não abunda na nossa classe política.

O depois já vocês sabem: Acidente? Atentado? O que é verdade é que ficaram muitas pontas soltas, muito por esclarecer. Após tantos inquéritos, ninguém foi capaz de uma conclusão inequívoca. E para falar verdade, nem sei se os nossos governantes querem que se apure a verdade. É que poderá sair muita gente chamuscada!

E o que fica hoje é o seu exemplo. Uma imensa saudade que tantos e tantos Portugueses sentem por aquele Homem que nos trouxe a Esperança, de que Portugal não teria que ser forçosamente o chiqueiro em que se tornou.

Hoje, dia 4, vão-se desmultiplicar “n” testemunhos da vida e obra de Sá Carneiro. O melhor tributo que lhe podemos prestar é o reconhecer que, com Sá Carneiro, o nosso país não se teria tornado naquilo que se tornou.

Não haveria políticos corruptos que, saídos dos governos, pululam de empresa pública em empresa pública, ganhando escandalosamente, “à Americana”, enquanto nós, os mexilhões, cada vez nos lixamos mais.

Não haveria governantes a declarar que se se provasse que eles tinham mentido, no dia seguinte sairiam do Governo e que logo a seguir, perante tantas e tantas provas da sua fuga à verdade diriam o contrário.

Não haveria Freeports, Faces Ocultas, corrupções a torto e a direito.

Não haveria Ministros com cursos “por encomenda” numa qualquer Universidade dos Trezentos.

Não haveria tanta e tanta falta de vergonha e de pudor daqueles que devem ser os primeiros a dar o exemplo.

30 anos…

Já lá vão tão longe, mas a ausência de Sá Carneiro só faz aumentar a vontade daqueles que, perante todas as adversidades, sabem que há um caminho, sabem que o Futuro é possível, que não temos que ser esta pobreza franciscana em que os nossos políticos nos transformaram!

Podem-me chamar sonhador, lírico, até, mas acredito que é possível!

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